Carta aberta às pessoas interessadas na EXIT! na
passagem de 2015 para 2016
Crise dos
refugiados – esta a expressão, nos debates políticos e mediáticos a partir do
segundo semestre deste ano, para referir todos os dramas por trás das pessoas
que procuram refúgio na Europa. Que não há crise de refugiados, mas sim crise do
capitalismo, que se expressa nas pessoas forçadas a fugir – tal facto é ignorado
deliberadamente ou, por assim dizer, compulsivamente. A impressão imediata
despertada pelas imagens – falsa imediatidade – determina a percepção.
As imagens das
condições caóticas, nas fronteiras externas da Europa e nos países de primeiro
contacto, tocaram os corações e despertaram simpatia. O ponto culminante foi a
foto em que se via um agente policial retirando do mar o menino de três anos
Aylan Kurdi morto. O jornal Bild (em 3.9.2015) publicou a fotografia emoldurada
a negro, a toda a largura da página e com o texto: "Imagens como esta
tornaram-se vergonhosamente diárias. Já não as suportamos, mas queremos e temos
de mostrá-las, porque elas documentam o fracasso histórico da nossa civilização
nesta questão dos refugiados." O problema não são os refugiados, mas que "nós"
não suportamos as imagens nem o “fracasso histórico da nossa civilização" que
elas documentam. Daí surge a necessidade de acção.
Na Alemanha algo
se fez: cultura de acolhimento foi a palavra mágica. Nas estações ferroviárias e
nas festas de recepção essa nova cultura de boas-vindas foi encenada como um
evento festivo. Surgiram imagens contra a desgraça e o fracasso histórico,
imagens contrárias àquelas que "nós" já não podemos "suportar". Foi encenada uma
Alemanha aberta ao mundo, que também se dá por solta e leve. A "revolta das
pessoas decentes" (a) poderia ser o "partido das pessoas decentes", as
"intervenções humanitárias" militares poderiam ser legiões de ajudantes
profissionais e voluntários. Aqueles que devem fazer isso são essencialmente
pessoas que têm de conseguir executar o seu trabalho diário, muitas vezes para
além dos limites da capacidade de resistência física e mental, em instituições
sociais com empregos mal pagos. Elas formam o pano de fundo para a imagem de uma
Alemanha aberta e humanitária, que agora enfrenta a horrível Alemanha dos
pregadores do ódio islamofóbico estúpido e daqueles que lhes dão ouvidos no
chamado centro da sociedade.
Na euforia do
estado de espírito festivo da nova "Alemanha de acolhimento" conseguiu-se
esquecer temporariamente algo. Foram esquecidas as imputações, as difamações de
conotação racista, os alarmismos e ataques, em cujo quadro fora imposto o
chamado compromisso de asilo (b) no início da década de 1990. Os refugiados eram
tudo menos bem-vindos, pelo contrário, eram suspeitos de todos os delitos
adequados para encher de medo e pavor as classes médias decentes: de ociosidade
parasita, passando pelo abuso social, até à criminalidade (1). O jornal Bild –
naquele tempo sem coração perante os refugiados – falou da Alemanha como um "país-contentor"
e alimentou os temores: "Quase a cada minuto um novo asilado. A enchente está a
subir – quando afunda o barco?" (2)
Esqueceu-se também
o encerramento sistemático das fronteiras da União Europeia – entre outras
coisas com o infame arame farpado da NATO, em que os refugiados ficam presos e
se esvaem em sangue – assim como as guerras e processos de destruição que
retiram sistematicamente às pessoas os meios de subsistência. Já Nietzsche,
alçado a profeta da pós-modernidade, tinha elogiado o esquecimento como condição
de felicidade, associando-o com o desfrutar do momento (3).
A felicidade do
clima de festa, no entanto, teve vida curta. Mesmo no meio do frenesim das
boas-vindas, a crise do capitalismo anunciou-se de volta com os seus aspectos
horríveis: justamente no fim de semana de 13 de Setembro, em que as equipas de
futebol da liga federal alemã – abstraindo de poucos opositores – entraram em
campo com um logotipo de boas-vindas, por iniciativa do jornal Bild, o governo
federal fechou as fronteiras com a Áustria. Os políticos exigiam sanções contra
os relutantes que se recusavam a receber os refugiados deportados da Alemanha.
Nos dias que se seguiram foram redescobertas a incontrolabilidade da euforia das
boas-vindas e as ameaças a ela associadas para a estabilidade interna e para o
Ocidente supostamente cristão. Propaganda do racismo e ataques racistas
continuam ou até aumentam.
"Os cidadãos estão
preocupados, os problemas não podem ser resolvidos pelo debate", disse um membro
do parlamento da Saxónia da CDU (ver Junge Welt de 21.09.2015). Tais
preocupações dos cidadãos exigem – como nos tempos de mudança do direito
fundamental de asilo – uma resposta que lhes dê direito – em sentido literal.
Aqui voltam a surgir de novo os conhecidos instrumentos de repressão, com os
quais os refugiados devem ser mantidos afastados das fronteiras, mais
rapidamente deportados ou selecionados, através do controle da imigração legal,
como úteis e bem-vindos ou como supérfluos: controles nas fronteiras, que são
restabelecidos tendo em vista as ameaças à ordem pública e a segurança interna,
maior rapidez no procedimento de asilo e nas deportações, mesmo sem fixação de
prazo, cortes nas prestações sociais, indo até prestações em espécie em vez de
dinheiro para os requerentes de asilo, a fim de reduzir os incentivos à
imigração e, contra a ameaça dos perigos do leste, o alargamento dos países de
origem seguros que, além da Sérvia, Macedónia e Bósnia-Herzegovina (desde 2014),
agora também incluem a Albânia, o Kosovo e o Montenegro. Também devem ser
mobilizados mais mil milhões de euros para proteger de forma mais eficiente as
fronteiras externas da União Europeia contra o assalto dos refugiados.
Independentemente
da intenção, especialmente dos/das ajudantes, de dar as boas-vindas aos
refugiados, no contexto político-económico as boas-vindas são reduzidas aos
refugiados com os quais as lacunas do mercado de trabalho podem ser colmatadas,
tendo em vista principalmente a falta de trabalhadores qualificados. Eles são
tão bem-vindos que são expostos a uma nova perseguição por caçadores de
talentos, que andam à procura de trabalhadores qualificados nos centros de
refugiados. Os obstáculos burocráticos para a sua integração no mercado de
trabalho devem ser eliminados.
Nem o olhar
calculista nos que podem ser aproveitados, nem a insistência maternal de Merkel
no que resta do direito de asilo, nem o empenhamento humanitário dos que tentam
facilitar a vida dos refugiados podem esconder o facto de que a crise do
capitalismo, que se exprime nos dramas dos refugiados, não tem solução
humanitária nem política. O grandioso "Nós podemos" esbarra em obstáculos
objectivos que nem com a melhor das boas vontades podem ser ultrapassados. Antes
de qualquer busca de saídas e de perspectivas, está a compreensão, o esforço
teórico. Seria preciso entender também os limites perante os quais qualquer
vontade tem de falhar. As fotos são mais um obstáculo. Elas fingem uma
imediatidade que não existe na realidade. De acordo com isso, Adorno aconselha,
contra o idealismo, a proibição de imagens. "O objecto da teoria não é nada de
imediato, cujo molde ela pudesse levar para casa; o conhecimento não tem um
álbum dos seus objectos, como a polícia do Estado" (Adorno, Theodor W.,
Negative Dialektik [Dialéctica Negativa], Frankfurt 2003: 206). Só aquele
que procura entender o empiricamente visível no contexto do quadro categorial em
que ele aparece é que consegue entender. Perante a chamada crise dos refugiados,
seria preciso recordar o quadro categorial em que Robert Kurz analisou os
fenómenos de desintegração dos Estados, o fim da soberania e as novas guerras
com isso relacionadas (ver Kurz, Robert, Weltordnungskrieg. Das Ende der
Souveränität und die Wandlungen des Imperialismus im Zeitalter der
Globalisierung [A
guerra de ordenamento mundial. O fim da soberania e as transformações do
imperialismo na era da globalização],
Bad Honnef 2003).
Agora é de facto
muito natural falar de "Estados desintegrados", mesmo no mainstream político. As
intervenções militares aceleram o colapso, especialmente quando, como na Síria,
os actores estatais regionais e globais se misturam na carnificina com os
produtos do desmoronamento. Enquanto, nos círculos burgueses e de esquerda, as
intervenções militares são muitas vezes responsabilizadas directamente pelos
processos de dissolução e também se apela imediatamente à paz, os processos de
crise que ocorrem objetivamente permanecem fora da consciência. Continua sem se
compreender que tais processos são o resultado do "patriarcado produtor de
mercadorias" (Roswitha Scholz) em desmoronamento, o qual agora também atinge
historicamente os limites da sua capacidade de reprodução, em consequência da
perda já não compensável de trabalho criador de mais-valia. Nesta situação caem
também os Estados, dependentes como estão do processo de criação de valor que
atingiu o fim das suas possibilidades. Os países da periferia são as primeiras
vítimas do sistema capitalista mundial em colapso. Eles desmoronam-se, mas não
desaparecem simplesmente de cena.
As destruições são
sofridas pelas pessoas que já não conseguem reproduzir a sua vida nas formas da
produção de mercadorias e do Estado. Nos espaços vazios aumentam as economias de
saque e as subculturas terroristas. Os conflitos armados em que os produtos do
decaimento se atacam uns aos outros – senhores da guerra que querem garantir o
domínio sobre os restos ainda utilizáveis de antigas estruturas, gangues
terroristas e intervenção militar – não podem ser considerados isolados deste
contexto. Portanto não é possível virar o comutador – com um pouco mais de boa
vontade – para o lado da paz. Assim, no quadro do sistema mundial em erosão,
continuará a acontecer que até os restos primitivos de meios de subsistência são
destruídos. As consequências são óbvias e tornam-se visíveis continuamente
também na Europa: "Quem ainda tem energia por aproveitar e não se torna
activista da economia de saque põe-se a andar, sozinho ou com a família, para os
países e regiões aclamados da economia de mercado global." (ibid: 157) Isto
muitas vezes apenas é possível recorrendo aos chamados grupos de passadores de
fronteiras. Estes, por sua vez, são produtos da decomposição do sistema mundial
e ao mesmo tempo objecto das suas intervenções militares. Tal como as
intervenções nas regiões em colapso, também aqui elas têm como objectivo ganhar
ainda a soberania sobre a própria decadência.
Quando os Estados
se desintegram, perdem o monopólio do poder, com ele perdem o domínio sobre o
território e, assim, a soberania. Eles desabam porque desaba a sua base – o
contexto formal de trabalho abstracto, valor (mais-valia) e dissociação. O
colapso da soberania do Estado é acompanhado pelo "fim da forma jurídica
moderna", que também está ligada "ao sistema fetichista de trabalho abstracto e
valorização do valor" (ibid: 324). A violação do direito internacional já se
mostrou no contexto da guerra contra o resto da Jugoslávia e das guerras e
intervenções subsequentes, com o resultado de se encontrarem em pé de igualdade
potentados de crise, terroristas e criminosos de guerra estatais. Na actual
situação de crise, o ataque ao hospital em Kunduz deveria evidenciar-se como
violação do direito internacional. O hospital já estava há muito na mira dos
serviços secretos e das forças de segurança. Ele teve a audácia de agir
humanitariamente e não fazer a distinção entre combatentes Talibãs, soldados e
civis, no tratamento dos feridos.
Não é por acaso
que a discussão sobre a crise dos refugiados cria a impressão de que se trata da
resposta a um estado de emergência. Mesmo antes de a crise dos refugiados se ter
tornado real e mediaticamente visível na Alemanha, já estavam na agenda
democrática as fronteiras como faixas de morte, a caça ao homem sobre os
refugiados, o internamento em campos de concentração com a selecção de acordo
com a etnia, a deportação para países que praticam a tortura. Tratava-se aqui de
excluir, também política e legalmente, os excluídos do processo de valorização e
de, ao mesmo tempo, os manter sob controle, para garantir a capacidade funcional
do sistema na crise. Para isso, as massas de pessoas não valorizáveis nas
regiões em colapso têm de ser mantidas sob controle e os não valorizáveis nos
centros têm de ser mais ou menos acalmados e ao mesmo tempo administrados
repressivamente. As normas legais são correspondentemente adaptadas ou
ignoradas.
Com os refugiados
e migrantes torna-se claro quanto a democracia e o Estado de direito estão
ligados ao processo de valorização. Sobre eles "é executado com toda a franqueza
o que constitui a lógica mais íntima do capitalismo em geral: a saber, a
tendência para reduzir o ser humano à sua 'utilidade económica', como unidade de
dispêndio de força de trabalho e de 'serviço'. O que ainda não é possível até às
últimas consequências para os cidadãos do próprio Estado, ou seja, 'reconhecer'
como ser humano apenas o homem máquina produtiva de utilização rentável, mas não
as crianças, idosos e doentes actualmente inúteis ou outros de qualquer modo não
produtivos, isso mesmo vem à luz do dia no tratamento dos migrantes com toda a
brutalidade: eles têm de ser jovens e saudáveis, de preferência sem filhos, sem
pai, sem mãe, sem apego nem compromisso fora ser 'útil' para o processo de
valorização local. E ainda mais bem-vindo é, naturalmente, o 'investidor'…"
(ibid: 227).
O estado normal do
direito aplica-se aos (ainda) valorizáveis. Para os restantes há as medidas de
emergência e coercivas – não apenas contra os supérfluos da periferia, mas
também contra os do centro. Robert Kurz mostrou claramente como o estado de
normalidade encontra o seu fundamento no "estado de excepção"; porque, como Carl
Schmitt deixou escapar: "Soberano é quem decide sobre o estado de excepção." (Schmitt,
Carl, Politische Theologie. Vier Kapitel zur Lehre von der Souveränität
[Teologia Política. Quatro capítulos sobre a
doutrina da soberania], Berlim 1996: 7; ver também Kurz 2003: 337 sg.). O
direito não se baseia na verdade, mas numa decisão da vontade do soberano e
assim, em última instância, na violência. Fundamenta-se na excepção e pode a
qualquer momento tornar-se a excepção. Nos processos de desjuridicização externa
e interna começam a "mesclar-se o estado de excepção democrático e o estado de
normalidade democrática" (Kurz, 2003: 343). A diferença em relação ao estado de
excepção utilizado pelos nazis está em que ele não foi proclamado e a
Constituição não foi formalmente revogada. Sob o signo da desintegração da
soberania do Estado, o momento ditatorial mistura-se "não só com o procedimento
democrático, mas também com a anomia pós-política e pós-soberana" (ibid: 344).
A relação entre
estado de excepção e estado de normalidade mostra-se no facto de o estatuto
jurídico dos indivíduos depender da possibilidade e capacidade de se submeterem
à relação de produção e reprodução capitalista. Durante a crise essas
capacidades atingem os seus limites, de modo que as pessoas caem fora do estado
de normalidade enquanto, ao mesmo tempo, os soberanos estatais atingem os
limites das suas capacidades de executar o estado de excepção por meio da
repressão. Aqui surgem "formas de transição da repressão social" que levam ao
ponto de desespero: "Os 'supérfluos' têm de..., sem qualquer possibilidade de
reprodução da sua vida, ser mandados embora para o nada, como na maior parte da
periferia ... ou, onde a soberania ainda está fortemente estabelecida, como nos
centros ocidentais ... têm de ser encerrados por tempo ilimitado em prisões,
centros de detenção e instalações semelhantes a campos concentração – tal como
os 'ilegais' e os refugiados" (ibid: 357).
Enquanto a crise
dos refugiados, não em último lugar graças ao poder das imagens, era posta em
primeiro plano, muitas outras situações de crise podiam ser esquecidas, como os
países da União Europeia em crise, a Ucrânia, a crise monetária – actualmente
visível na queda das taxas de câmbio nos países emergentes eleitos como
locomotivas da economia mundial e nos grandes déficits em conta corrente
associados à crise cambial – a redução sem perspectivas das taxas de juro
directoras e a hesitação da Reserva Federal dos EUA perante o seu aumento, o
crescimento dos movimentos nacionalistas e de extrema-direita, com os quais as
nações se estão a perder, grandes cidades cheias de sem-abrigo e municípios
sobre-endividados entre muitas outras situações. Em toda a disputa entre os
Estados europeus sobre a gestão da crise dos refugiados também são evidentes
fissuras
que não podem ser betumadas pelas duras
críticas à falta de cultura de boas-vindas e à expressão de xenofobia, nem por
exortações amigáveis à solidariedade europeia.
A crise segue o
seu curso no quadro definido pelo contexto formal capitalista, nas costas dos
actores que nela intervêm – independentemente do facto de ser percebida ou não.
Ela surge em fenómenos contraditórios e tem de ser processada pelos indivíduos
enfeitiçados na forma de sujeito. Formas imediatas de processamento aparecem nos
extremos, tanto de uma cultura de boas-vindas, que se associa com o fechar dos
olhos, como no pânico de raiva e vacuidade impotentes, que expressam o seu ódio
em objectos variados.
A constituição
específica do sujeito que tem de processar a crise incompreendida foi o foco do
seminário da EXIT! deste ano, a partir de uma perspectiva psicanalítica.
Estiveram em debate as correlações entre o carácter social narcisista
pós-moderno, sem relações com o objecto, e a negação e recalcamento da crise.
Mesmo o facto de a
crise parecer óbvia, com os refugiados nos centros isolados, não desencadeia
qualquer reflexão teórica. As aversões pós-modernas à certeza substancial e
histórica continuam a revelar-se imperturbáveis e resistentes à perplexidade. Na
era pós-moderna, juntamente com a negação da crise, emergiu um carácter social
narcisista. Não em último lugar, este carácter social narcisista, que se
expressa na obsessão do reconhecimento, na negação da objetividade e na
impotência, torna-se uma barreira para a recepção da teoria radical da crise. A
psicanálise, como objecto da elaboração teórica da crítica da dissociação-valor,
também pode, com a sua reflexão sobre as implicações psicodinâmicas do carácter
social narcisista, esclarecer as barreiras e resistências que se opõem à teoria
radical da crise na esquerda, nos movimentos sociais e na maioria dos
indivíduos. A inclusão do plano psicanalítico é um passo essencial no
desenvolvimento da teoria da dissociação-valor – especialmente tendo em conta a
crise que continua a agudizar-se dramaticamente e que tem de ser processada
pelos indivíduos.
De elucidação
carece também um fenómeno já referido em 1997, numa breve recensão de
O colapso da modernização
(Kurz, Robert, Frankfurt am Main 1991): "O prognóstico sombrio de Kurz paralisa
obviamente a força da argumentação racional" (Kern, Bruno, Literaturbericht
Ökonomie [Economia nas notícias literárias], em: Concilium.
Internationale Zeitschrift für Theologie [Concilium. Revista Internacional
de Teologia, 2/1997, 282-286, 286.) A recusa de um debate em termos de conteúdo
com a teoria radical da crise, na sua resistência à perplexidade, não se tem
deixado perturbar nem sequer pelos desenvolvimentos da crise obviamente em
agravamento. As previsões negras desaparecem com a ajuda de promissores eventos
pós-modernos. O capitalismo parece a-histórico e eterno, como um constante
regresso do mesmo, de crise e recuperação, após uma fase de limpeza criativa.
Isso também se aplica de forma imperturbável mesmo se, bem obviamente, não há
qualquer nova criação de valor à vista e, desde 2007, também se esgota o meio de
a conseguir, o sempre igual aumento da massa monetária, levando sempre ao mesmo
resultado: é preciso ainda mais dinheiro para compensar a falta de criação de
novo valor. Na lógica a-histórica do sempre igual não pode ser pensado o final
de um desenvolvimento – e muito menos um final negativo.
Quem assenta num
fazer negador da objetividade das relações, bem como na impotência, em vez de na
reflexão teórica, não vai escapar à negação da percepção, nem ao agir que lhe
está associado a partir da falsa imediatidade. Isto aplica-se tanto aos
eufóricos das boas-vindas como ao cidadãos em fúria e ódio. Quem, face ao
agravamento da crise, se vira para o activismo já perdeu a conexão reflexiva com
a realidade repetidamente invocada. Só pode ser feita – e mesmo assim apenas
temporariamente – a gestão da crise. Esta alterna entre a ajuda de curto prazo
(boas-vindas para alguns, especialmente os úteis), a intensificação da repressão
– onde as bases para isso ainda existem – e os processos de barbarização que
alastram. Também poderão ser feitas encenações, onde a raiva e o ódio se
descarregam.
A EXIT! representa
o esforço para entender a crise através da reflexão. A crítica categorial da
relação de dissociação-valor liga-se à análise dos processos e desenvolvimentos
históricos, bem como do processamento da crise pelos indivíduos. Entender o que
ocorre estruturalmente no globo e o que acontece com as pessoas é tão essencial
para o processamento da crise quanto para a questão de suplantar a socialização
capitalista, que apenas é realista na negação estrita das suas categorias.
Os desafios são
grandes e os nossos recursos para lidar com eles são extremamente limitados.
Isto aplica-se, não em último lugar, também aos recursos financeiros. Estes têm
de ser obtidos numa sociedade que é objecto da crítica radical. Na
indeterminação do espírito pós-moderno e da sua recusa de reflexão, o "mercado"
– apesar de de toda a “falta de transparência” e da crescente pressão do
problema – não grita propriamente pela orientação pela 'oferta' de crítica
radical. No entanto, porque esta última é útil e necessária, também a crítica da
dissociação-valor relacionada com o projecto EXIT! conta com o apoio financeiro
dos associados e doadores. É esse apoio que queremos pedir expressamente às
nossas leitoras e leitores.
Herbert Böttcher pela redacção e pela direcção
******
Os donativos para apoio do projecto EXIT são
fiscalmente dedutíveis e são solicitados pela:
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Gesellschaftswissenschaften
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______________________________________________________________________________________
(1) Numa
declaração de Klaus Landowsky, então presidente do grupo parlamentar da CDU na
Câmara de Deputados de Berlim, resume-se bem a atmosfera: "Não pode ser que
parte dos estrangeiros andem pelas ruas pedindo, enganando e até mesmo
apunhalando, sejam presos e só porque gritam a palavra 'asilo' vivam à custa do
contribuinte." Ver Appel,
Roland:.Die Asyl-Lüge: Was tun, wenn ein Grundrecht demontiert wird?
[A mentira do asilo: O que fazer se um direito
fundamental é desmontado?] in: Appel, Roland / Roth, Claudia: Die Asyl-Lüge.
Ein Handbuch gegen Fremdenfeindlichkeit und Rassismus [A mentira do asilo.
Um manual contra a xenofobia e o racismo], Colónia 1992: 12-58 e 32
(2) Ibid.
(3) "No mínimo, no
entanto, e na maior felicidade, há sempre uma coisa pela qual a felicidade se
torna felicidade: o poder esquecer... Quem é incapaz de se sentar no limiar do
momento, esquecendo todos os passados, quem não consegue pôr-se de pé num ponto,
como uma deusa da vitória, sem vertigens nem medo, esse nunca vai saber o que é
felicidade…" (Nietzsche, Friedrich, Sämtliche Werke. Kritische Studienausgabe
[Obras completas. Edição crítica], Berlim e Nova Iorque, 1967, vol. 1:.
250.)
NOTAS DO TRADUTOR
(a) Aufstand
der Anständigen [revolta das pessoas decentes] refere-se ao apelo do então
chanceler Schröder ao visitar em 4.10.2000 uma Sinagoga em Düsseldorf que tinha
sido objecto de um ataque incendiário dois dias antes.
(b)
Asylkompromiss
[compromiso de asilo] foi um pacto clebrado
entre a CDU/CSU e o SPD para viabilzar uma revisão constitucional, que se veio a
concretizar em Maio de 1993, restringindo drasticamente o direito de asilo até
aí garantido pela Constituição da RFA.