Falência do Estado e assalto aos bancos
O pior já passou, assim reza a fórmula oficial de exorcismo. Na realidade, apenas se estreitou o horizonte da percepção. Já não se quer pensar em períodos cíclicos (muito menos históricos), mas apenas em valores mensais. Também é tabu o tema das relações estruturais no mercado mundial, tal como o do relacionamento entre o Estado e a economia. Apenas têm saída as pretensas histórias de sucesso de empresas e sectores económicos. Mas não adianta enterrar a cabeça na areia. O “caso Grécia" trouxe à luz do dia que agora, sem grande surpresa, o verme da crise vai roendo as finanças públicas. A primeira insolvência de facto de um importante Estado membro da União Europeia é um sinal fatídico para a evolução futura. Espanha, Portugal, Irlanda, Itália e naturalmente o leste da Europa são os próximos candidatos a ficar na corda bamba, e não só. Já se podem ouvir os sussurros de que também a condição financeira dos centros capitalistas, E.U.A., Grã-Bretanha, França e Alemanha, poderá ter-se agravado dramaticamente. As consequências dos pactos de salvamento sem precedentes e dos programas de apoio económico, que deveriam estimular e simular a retoma do crescimento, ameaçam repercutir-se a curto e médio prazo no sistema financeiro e na conjuntura económica.
A União Europeia quer tapar as fissuras no vigamento, colocando sob curatela o orçamento de Estado da Grécia. De trimestre em trimestre devem tornar-se obrigatórias drásticas medidas de contenção. Isso vai levar ao colapso dos sistemas sociais e da economia doméstica, num país já perturbado. Se o caso é apresentado como exemplo, pode-se calcular o que acabará por chegar, mais cedo ou mais tarde, a todos os países centrais, dentro e fora da União Europeia (incluindo o milagre económico chinês). Na Alemanha, o aperto da tarraxa nas contribuições do seguro de saúde é apenas uma pequena prova antecipada. Uma nova onda de desmantelamento dos sistemas de previdência estaduais e das infra-estruturas públicas junta-se com a onda iminente de falências de empresas e de despedimentos. Também neste aspecto a Grécia pode ser pioneira.
Ao mesmo tempo, a zona euro está sujeita a um teste de resistência. Revela-se como ilusão a ideia de que pudesse ascender a nova moeda mundial a construção artificial do Euro, implantada no contexto da concorrência da globalização, com base em níveis nacionais de acumulação e de produtividade completamente diferentes. A travagem de emergência nas finanças gregas mostra a fragilidade do sistema monetário europeu. No apuro em que se encontram, os países da União Europeia deitam mão a meios musculados para impor rédea curta aos paraísos fiscais, há muito tolerados nas suas fileiras. Um debate animado, no primeiro canal da televisão alemã, sobre o novo “assalto aos bancos na Suíça", é bem eloquente. Depois de Steinbrück, por maioria de razão também Schäuble gostaria de limpar os cofres suíços. Perante a montanha da dívida, na ordem de grandeza dos biliões de euros, o “assalto aos bancos” feito pelo Estado, que poderá trazer 200 milhões na melhor das hipóteses, só pode ser descrito como desespero. Assim se tornam também evidentes as contradições entre o sistema jurídico nacional e o internacional. Neste ponto, os problemas agora são resolvidos, por assim dizer, a murro. A crise económica mundial está longe de terminada. Depois dos mercados financeiros, são as finanças públicas que constituem o próximo catalisador duma desestabilização económica, em que a desvalorização geral do capital vai abrindo caminho aos solavancos.
Original STAATSBANKROTT UND BANKÜBERFALL in www.exit-online.org. Publicado Neues Deutschland, 05.02.2010